Nasci chorando. E hoje sou a única neste lugar que não vive a gargalhar por aí. Talvez este seja o motivo. Talvez não.

De teimosa que sou, quando nasci demorei a falar. Na verdade eles não queriam que eu falasse e sim que eu repetisse a fala deles. De teimosa que sou me recusei.  

Sentada no carrinho observava-os. Com vozes estranhas eles repetiam palavras que não me faziam sentido algum. E assim eu olhava desanimada e incrédula por perceber o caminho que a vida me reservava. Por isso, demorei a falar.  

Tempos felizes aqueles. Hoje, preciso sorrir, mesmo quando não tenho motivos.  

Ai de mim se não sorrir!

Eu já não tenho forças para lutar contra isso, sinceramente não vejo alternativa. Sinto náuseas ao constatar que estou aqui única e exclusivamente para satisfazer o outro.  

Este outro, que me obriga a sorrir e a falar de coisas boas e bobas. Assuntos pré determinados. Ai de mim se não sorrir! Vão dizer que eu azedo o dia das pessoas ou que a minha energia está pesada. Sou alguém que preza pela boa energia, então me forço a sorrir o tempo todo. Sorrio e não revelo a verdade sobre a energia destas pessoas que vivem dizendo que meu mau humor traz energias ruins para o ambiente, elas  não sabem que na verdade é a energia delas que me faz não querer sorrir.

Meu refúgio é o meu próprio mundo. Quando estou sozinha, não sorrio e me permito ser apática. Quando estou sozinha não preciso fingir que me interesso por assuntos pré determinados. Fico aqui sentada nesta poltrona amarela, com a porta do quarto trancada, para que ninguém entre. Passo longas horas com o olhar paralisado. Ah que alívio poder ser eu mesma! Ai de mim, ser eu mesma perto deles!  

Para mim, não há problema em não sorrir. Mas o problema aqui é o outro. O outro, sempre o outro. Olha ele aqui de novo. O mesmo “outro” que me forçava a falar as primeiras palavras, sem ao menos se importar se eram estas as palavras que eu gostaria de dizer. Este mesmo "outro" hoje me força a sorrir e a falar sobre coisas tolas simplesmente para satisfazê-lo.  

Hoje sorrio para não falar aquilo que penso e sinto saudades de quando eu era criança. Pensando bem, talvez o meu erro tenha sido sorrir para eles. Embora todos estivessem frustrados pela minha inaptidão em falar eles passaram a se contentar com o meu sorriso.

Aprendi desde pequena, que o outro sempre se contenta com um sorriso, mesmo que ele não seja verdadeiro. Mesmo que por dentro haja um abismo, mesmo que o meu mundo esteja caindo. O outro fica feliz ao me sorrir. Sempre o outro, olha ele aqui de novo.